Divaldo está sendo investigado criminalmente e administrativamente, pois, no entendimento do MP/RS, gestores municipais não podem alterar o plano federal, independente do mérito. Caso ele venha a ser indiciado e condenado no decorrer das investigações, Divaldo pode perder o cargo.
O Ministério Público (MP) do Rio Grande do Sul instaurou procedimento para apurar eventual irregularidade na campanha de vacinação contra o coronavírus em Bagé, no sul do Estado. Por meio da Procuradoria de Prefeitos, o órgão vai avaliar se a decisão do prefeito Divaldo Lara de incluir profissionais de segurança pública, neste momento, na ordem de vacinação configura crime de responsabilidade. A promotoria de Justiça de Bagé também instaurou expediente para examinar possível improbidade administrativa.
Na última sexta-feira (19), a prefeitura de Bagé anunciou a inclusão de novas faixas etárias na aplicação de doses, atingindo idosos de 72 a 74 anos, e também de agentes da área de segurança. Na data, Lara inclusive acompanhou a imunização de policiais e comemorou a medida.
— É um dia especial por estarmos vacinando os profissionais de segurança que também estão na linha de frente desde o começo da pandemia e merecem estar protegidos. Saúde e segurança caminham juntas — destacou o chefe do Executivo, conforme texto produzido pelo setor de comunicação social da prefeitura.
Foram imunizados cerca de 400 servidores das polícias Federal, Civil, Rodoviária e Penal, da Brigada Militar e ainda agentes do Presídio Regional, entre outros.
Por meio de nota, o MP destacou, na manhã desta terça-feira (23), que não avalia o mérito da iniciativa, apenas a possível alteração na ordem dos grupos de vacinação, que segue regras centralizadas.
De acordo com a ordenação informada pela Secretaria Estadual de Saúde a partir das orientações do Ministério da Saúde, as forças de segurança e salvamento figuram após outros grupos na fila, atrás de pessoas com comorbidades, da população privada de liberdade, de funcionários do sistema prisional e de pessoas em situação de rua.
Na nota, o MP declara que “Lara determinou a vacinação antecipada de alguns grupos, o que contraria regra do Plano Nacional de Imunização. As alterações no plano, de gestão do Ministério da Saúde, não podem ser feitas pelos gestores municipais, independentemente do mérito”.
Em razão disso, a Promotoria de Justiça de Bagé, segundo o coordenador do Centro de Apoio Operacional Cível, José Francisco Seabra Mendes Júnior, “irá colher dados e examinar se houve violação dos princípios da administração pública (art. 11 da Lei de 8.429/1992), cujas sanções previstas incluem multa, suspensão dos direitos políticos, proibição do direito de contratar com o poder público e perda da função pública”.
Ainda conforme a nota do MP, a coordenadora da Procuradoria de Prefeitos, Ana Rita Schinetsck, afirma que “estão sendo solicitadas informações à Promotoria de Justiça de Bagé e, na sequência, à prefeitura de Bagé, a respeito da mencionada inversão na ordem de vacinação”.
Procurada por GZH, a assessoria de comunicação da prefeitura de Bagé informou que a gestão municipal “jamais deixou de cumprir as metas de vacinação estabelecidas para as respectivas faixas etárias”, conforme o Plano Nacional de Imunização.
Quanto à vacinação de agentes de segurança, a prefeitura justifica a medida como decorrente do “enfrentamento de uma grave crise sanitária, pontual, instalada no âmbito dos órgãos de segurança no município, com contaminação em massa no Presídio Regional de Bagé, o que refletiu no afastamento de muitos profissionais deste setor”. Ainda segundo o comunicado, o cronograma oficial com base no calendário do Plano Nacional de Imunização “não sofrerá qualquer prejuízo ou solução de continuidade”.
A Secretaria da Segurança Pública do Estado, a pedido de GZH, também se pronunciou sobre o caso. Por escrito, destacou que “o governo estadual tem pleiteado junto do governo federal a priorização das forças policiais no cronograma nacional de imunização contra o coronavírus”. Conforme o órgão estadual, “há expectativa de que o Plano Nacional de Imunização seja alterado nos próximos dias”. Apesar disso, a pasta faz a ressalva de que, “enquanto não houver essa alteração por parte da União, a orientação da Secretaria Estadual da Saúde é de que seja dada sequência à vacinação na ordem determinada pelo PNI. A iniciativa autônoma da prefeitura de Bagé e outros municípios não nos cabe comentar”.
Leia a nota do MP-RS na íntegra
“O Ministério Público do Rio Grande do Sul instaurou na Procuradoria de Prefeitos expediente para avaliar, sob o prisma criminal, decisão do prefeito de Bagé, Divaldo Lara, de alterar a ordem dos grupos na vacinação. Também foi instaurado na Promotoria de Justiça de Bagé um expediente para avaliar o fato sob o prisma da improbidade administrativa. Lara determinou a vacinação antecipada de alguns grupos, o que contraria regra do Plano Nacional de Imunização. As alterações no plano, de gestão do Ministério da Saúde, não podem ser feitas pelos gestores municipais, independentemente do mérito.
Segundo o coordenador do Centro de Apoio Operacional Cível, José Francisco Seabra Mendes Júnior, a Promotoria de Justiça Bagé irá colher dados e examinar se houve violação dos princípios da administração pública (art. 11 da Lei de 8.429/1992), cujas sanções previstas incluem multa, suspensão dos direitos políticos, proibição do direito de contratar com o poder público e perda da função pública. Os princípios da administração pública, previstos na Constituição Federal, são legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência.
De acordo com a coordenadora da Procuradoria de Prefeitos, Ana Rita Schinetsck, estão sendo solicitadas informações à Promotoria de Justiça de Bagé e, na sequência, à Prefeitura de Bagé, a respeito da mencionada inversão na ordem de vacinação.”
Leia a nota da prefeitura de Bagé na íntegra
“A prefeitura de Bagé informa que ainda não foi intimada acerca de qualquer ação. Sobre ter vacinado os agentes de segurança, a justificativa é o enfrentamento de uma grave crise sanitária, pontual, instalada no âmbito dos órgãos de segurança no município, com contaminação em massa no Presídio regional de Bagé, o que refletiu no afastamento de muitos profissionais deste setor. Foram destinadas cerca de 400 doses para estes profissionais que ajudam no combate à pandemia. O calendário constante do Plano Nacional de Imunização, que preconiza a vacinação da faixa etária de 70 anos até o próximo dia 27, recorte atual do cronograma, não sofrerá qualquer prejuízo ou solução de continuidade. A prefeitura, por meio da Secretaria de Saúde de Bagé, jamais deixou de cumprir as metas de vacinação estabelecidas para as respectivas faixas etárias, conforme estratificado no Plano.”
Leia a nota da Secretaria da Segurança Pública na íntegra
O governo estadual tem pleiteado junto do governo federal a priorização das forças policiais no cronograma nacional de imunização contra o coronavírus. A SSP enviou no dia 8/12/2020 ofício para o Ministro da Justiça e Segurança Pública externando preocupação com o plano divulgado e solicitando que os profissionais da segurança, que durante a pandemia atuam na linha de frente, sejam priorizados. Em razão dessa iniciativa e de movimentos semelhantes por parte de outros Estados, há expectativa de que o Plano Nacional de Imunização (PNI) seja alterado nos próximos dias. Enquanto não houver essa alteração por parte da União, a orientação da Secretaria Estadual da Saúde é de que seja dada sequência à vacinação na ordem determinada pelo PNI. A iniciativa autônoma da prefeitura de Bagé e outros municípios não nos cabe comentar.
Protestos
Na última segunda-feira (22), servidores da Polícia Civil realizaram uma carreata em Porto Alegre pedindo a inclusão da categoria entre os grupos prioritários para receber a vacina contra a covid-19. Cerca de 50 carros percorreram ruas e avenidas da Capital. Entidade que representa a classe cita a morte de profissionais no pleito.
A chefe da Polícia Civil no Rio Grande do Sul, delegada Nadine Anflor, disse que a solicitação dos policiais pela vacinação é “legítima e deve provocar a rediscussão das prioridades no âmbito do Ministério da Saúde, já que os policiais, juntamente com os profissionais da saúde, não pararam em nenhum momento durante a pandemia”.
No Acre, Polícia Civil entrou na frente
O prefeito de Epitaciolândia (Acre), Sérgio Lopes (PSDB/AC), ignorou as regras do Plano Nacional de Imunização (PNI) e começou a vacinação contra a covid-19 pelos servidores da Polícia Civil.
Ao justificar a vacinação, Sérgio Lopes diz que foi autorizado pelo Conselho Municipal de Saúde. “Não podemos colaborar com a invisibilidade que está sendo institucionalizada e aplicada a esses servidores. Optamos por agir e esperamos que o exemplo do nosso município se espalhe”, declarou o prefeito.
O Ministério Público do Acre (MP/AC) solicitará esclarecimentos sobre a aplicação do imunizante de forma contrária ao definido no PNI, e pode abrir inquérito sobre a prática do gestor. “Cabe ressaltar que todos os agentes públicos são obrigados a zelar pela estrita observância dos princípios da legalidade”, comentou o promotor Rodrigo Fontoura.
Além dos civis e militares, o prefeito pretende vacinar também os policiais penais, agentes socioeducativos, bombeiros e militares do Exército. Isso pode colocar em xeque a vacinação dos idosos da cidade, e dos profissionais de saúde, que são prioridade dentro do PNI.
Em nota, a Secretaria de Saúde do Acre (Sesacre) criticou a postura do prefeito. “Dadas todas as justificativas, não compete ao Componente Estadual, nem Municipal, a inversão de ordens de grupos prioritários, além de ressaltamos que a adoção de outras prioridades que tratam da população-alvo pode implicar no prejuízo das ações de vacinação dos grupos vigentes”, avalia a Secretaria.
Após o envio das informações pelo prefeito, o MP/AC pode instaurar inquérito civil para apurar responsabilidades e eventual prática de improbidade administrativa por parte do prefeito da cidade, em decorrência de burla à ordem de prioridade de vacinação contra a covid-19.