Ela denunciou que durante a abordagem os policiais da operação teriam feito disparos de balas de borracha; caso ainda é investigado
A delegada Monah Zein, de 38 anos, que ficou trancada por mais de 30 horas dentro do apartamento dela, no bairro Ouro Preto, em Belo Horizonte, utilizou as redes sociais na madrugada desta terça-feira (16 de janeiro) para denunciar o tratamento recebido pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) após o episódio que ocorreu no fim de novembro do ano passado, entre os dias 21 e 22. Ela disse que, durante a abordagem, os policiais que participaram da operação teriam feito disparos de balas de borracha em direção à parede do apartamento. Zein reafirmou ter atirado contra os agentes e justificou que essa foi uma reação à situação de pressão proporcionada pelo momento. Na ocasião, a delegada chegou a ser presa, mas teve a liberdade provisória determinada pela Justiça no dia 24 de novembro. O caso está em segredo de Justiça.
“Passados dois meses, tudo o que tive da instituição foi bloqueios, novas sindicâncias e nenhuma (nem mesmo fingindo) procura para saber se o surto psicótico passou, se melhorei“, publicou em uma rede social. A delegada também divulgou uma imagem da parede do apartamento com marcas que seriam de bala de borracha. “Duas marcas causadas por disparos de arma de borracha. Não assumidas pelos causadores e muito menos na coletiva (feita pela Polícia Civil sobre o caso) que me fez uma criminosa”, acrescentou.
A delegada também questionou os boletins de ocorrência registrados em relação à operação realizada no apartamento dela. Segundo Zein, foram três registros formais, que não citam a dinâmica dos acontecimentos e nem a atuação das equipes. De acordo com ela, os registros possuem divergências.
“Em um registro há inclusive um auto de resistência onde alega-se que, ao cumprirem um mandado de prisão contra mim, eu me debati e atirei em todos, então fui sedada. Não houve prisão, não houve voz de prisão, não me debati, não fui atendida pelo Samu. Fui simplesmente cercada por dez policiais que não paravam de vir para cima de mim, sendo empurrada, sedada e sem chance de dar a minha versão dos fatos“, escreveu.
Monah Zein também admitiu ter atirado contra os policiais. No entanto, segundo ela, essa teria sido uma reação “à dinâmica dos fatos pelo estresse e pelo medo que passou durante a operação”. “Um disparo não é capaz de atentar contra a vida de quatro pessoas, especialmente quando três estão atrás de escudo balístico e outra atrás da porta. Eu não recebi eles a tiros, eu aguentei foi e muito a violação de direitos que eu estava vivendo por pessoas que não confio”, acrescentou.
A delegada também elogiou a decisão da Justiça, que, durante a audiência de custódia, optou por não determinar a prisão provisória e o afastamento do cargo. “Ainda existe quem entende de direitos fundamentais e não precisa de conjectura para saber que aquilo não foi legítimo, nem justificável, passando de todos os limites aceitáveis. Chegando ao deplorável fim de precisaram esconder o que fizeram e me incriminar para não responderem pelos excessos”, finalizou.
A reportagem de O TEMPO questionou a Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) sobre o relato publicado pela delegada e as denúncias apontadas por ela. A matéria será atualizada com o posicionamento. A Justiça também foi questionada sobre o estágio da investigação.
Entenda o caso
A confusão envolvendo a delegada Monah Zein teve início na manhã do dia 21 de novembro, mas se tornou pública na tarde do mesmo dia, após a policial fazer uma live em seu Instagram mostrando o interior de seu apartamento enquanto negociava com outros agentes, que estavam do lado de fora. Nas imagens, a mulher aparecia portando uma arma que, em dado momento, foi jogada para fora de casa por ela em frente às câmeras.
Monah relatou, ainda, durante a transmissão ao vivo, que, às 9h30, colegas teriam ido até a casa dela depois de ela enviar mensagens em um grupo dizendo que não retornaria ao trabalho. Após conversar com os policiais, ela teria, então, retirado o interfone da casa do gancho, o que os levou a chamar o Corpo de Bombeiros e a polícia. “Eles não querem me ajudar, eles querem fazer o cenário onde eu estou louca, doente, armada, perigosa, sendo que não existe isso”, disse a delegada durante a live.
A mulher também admitiu ter atirado contra colegas de profissão. “Quatro homens armados, com escudo, para tirar minha arma? Sendo que eu estou trabalhando normal, eu só avisei que não vou para a delegacia e eles vêm aqui fazer esse transtorno? Fazer eu dar seis tiros na escada de incêndio?”, falou Monah. A informação de disparos dentro da casa foi confirmada no primeiro dia pela Polícia Civil, por nota, mas sem detalhes.
Delegada estava de férias
No dia 22 de novembro, depois de toda uma noite de negociação, o porta-voz da Polícia Civil, delegado Saulo Castro, informou que a delegada Monah Zein retornaria na terça ao trabalho após um período de afastamento, primeiramente por “questões médicas” e, em seguida, por férias.
“Ela enviou em um grupo dos colegas de trabalho uma mensagem que sugeria algo que pudesse levar uma situação contra a própria saúde dela. Nesse sentido, os próprios colegas do local de trabalho vieram para cá acompanhados dos profissionais do nosso Centro Biopsicossocial, no intuito de acolher a colega e preservá-la”, argumentou.
Ainda conforme Castro, entretanto, a conversa inicial não teria se “desdobrado” como a polícia imaginava. “A colega estava um pouco mais exaltada e, diante desse cenário de crise, a partir dos protocolos a Polícia Civil julgou necessário chamar a Core, para iniciar essa negociação, para que a gente chegue no desfecho o mais breve possível”, completou.
Denúncia de assédio e perseguições
O advogado Leandro Martins, que esteve à frente da defesa da delegada, afirmou que a profissional da segurança pública sofreu “perseguições” e “retaliações” no exercício da profissão. No comunicado, Martins lamentou profundamente o estado de saúde delicado no qual a delegada se encontrava momentaneamente. Ele alegou que isso teria sido resultado de “perseguições” e “retaliações” sofridas no decorrer dos anos.
Na porta do imóvel, a advogada Jucelia Braz, que também representou Monah, afirmou que sua cliente alegava ser vítima de assédio moral por parte da Instituição, o que teria motivado toda a situação. “Infelizmente, é conhecimento de todos os casos de assédio moral que cometem contra os policiais, principalmente contra as mulheres, que sofrem dentro da Polícia Civil, então, vamos tomar algumas providências para tentar acalmá-la e tirá-la de dentro o mais rápido possível”, disse, na ocasião.
Fonte: https://www.otempo.com.br/cidades/delegada-que-ficou-trancada-em-apartamento-em-bh-faz-desabafo-na-web-1.3312489