Escrivão que atua na unidade denuncia que vítimas deixam a unidade sem conseguir registrar o crime; delegacia tem móveis precários, infiltração e geladeira estragada
Um escrivão da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) denuncia situação de precariedade e de omissão nos atendimentos na Delegacia de Plantão Especializada em Atendimento à Mulher, em Belo Horizonte. Ele relata que alguns dos servidores se recusam a atender mulheres vítimas de algum tipo violência durante os plantões. Por causa da omissão, elas passam horas na delegacia aguardando por atendimento e até mesmo deixam a unidade sem registrar o crime. O servidor relata ainda que os móveis estão em mau estado de conservação, que os computadores não funcionam e que a única geladeira da unidade, que estragou no último mês, ainda não foi substituída. A denúncia é feita dias após o Governo de Minas pedir doações para reformar o edifício institucional da Delegacia Especializada em Roubo de Cargas, no bairro Gameleira, na região Oeste da capital.
“Tem mulher que passa mais de dez horas para conseguir registrar o boletim de ocorrência. Outras passam todo esse tempo, desistem e saem sem registrar”, afirma o escrivão, que pediu anonimato, por medo de represália. Para ele, a demora no atendimento, que impede o registro dos crimes, é resultado da omissão de alguns servidores que, devido aos cargos ocupados, se recusam a atender as vítimas. “A delegacia tem dois escrivães que em um único plantão registram 23 denúncias, e seis investigadores que fazem 12. Eles se recusam a atender essas mulheres e passam todo o tempo de trabalho sem ter o que fazer. É uma situação que revolta, essas mulheres acabam sendo vítimas de mais uma violência”, acrescenta.
Durante um plantão de 12h, a delegacia conta com uma equipe formada por dois escrivães e até seis investigadores. Os escrivães são responsáveis por atender as mulheres vítimas de violência que chegam à unidade acompanhadas da Polícia Militar. Os investigadores, por sua vez, atendem aquelas que vão à delegacia sozinhas. Durante os atendimentos, os escrivães são responsáveis por registrar as denúncias feitas pela vítima, o policial e a testemunha. Os investigadores registram apenas o que é denunciado pelas mulheres.
“O volume de atendimentos é muito maior entre aquelas que chegam com a polícia, que é uma mulher que já está desesperada com a violência. Então como tem essa separação nos atendimentos, a delegacia fica sempre cheia e isso impede que muitas consigam registrar o crime que foram vítimas. O que precisa ser entendido é que a delegacia das mulheres merece uma atenção especial, todo policial precisa ser especializado para realizar esse atendimento”, expõe o escrivão.
A Polícia Civil de Minas Gerais garantiu, por meio de nota, que não tem conhecimento de recusa em atender vítimas de violência de gênero por parte de servidores da Delegacia de Plantão de Mulheres (Depam). “A Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) esclarece que vem trabalhando constantemente para aprimorar o fluxo de acolhimento às mulheres vítimas de violência doméstica, não só na Delegacia de Plantão de Mulheres, localizada na avenida Barbacena, em BH, como também em todas as suas unidades”, destacou.
Precariedade
As imagens recebidas pela reportagem de O TEMPO mostram a situação de precariedade na Delegacia de Plantão de Mulheres, da avenida Barbacena, em Belo Horizonte. A geladeira, encostada no canto de uma sala, possui um aviso de que está estraga. Os suportes dos computadores contam com fitas adesivas que ajudam a fixar os monitores. As cadeiras estão com as poltronas e os suportes para os braços e as colunas danificados. As portas dos armários também estão sem manutenção, e a unidade sofre com infiltrações durante os dias com chuva.
“É uma situação que revolta. A gente vê, por exemplo, nos sites do Governo e da Polícia o anúncio de compras de viaturas e a impressão que passa é que está tudo certo, e não está. Na delegacia, as cadeiras não têm ajustes de altura e coluna, as mesas estão danificadas, geladeira estragada, infiltração, entre outros tantos problemas”, descreve o escrivão.
A Polícia Civil de Minas Gerais reconhece as denúncias e afirma que há uma preocupação em levar melhorias para seus servidores em relação às condições do local e materiais de trabalho. “A equipe está sempre atenta aos insumos de trabalho da delegacia que requeiram restauração, sendo normal o desgaste natural de objetos, os quais vêm sendo substituídos quando da solicitação dos servidores”, disse.
A instituição afirmou ainda que foi desenvolvido nos últimos meses um projeto de aperfeiçoamento da unidade. A medida, segundo a Polícia, foi pensada “visando o bem-estar dos servidores e das vítimas acolhidas”.
FONTE: https://www.otempo.com.br/cidades/delegacia-das-mulheres-em-bh-opera-sob-denuncia-de-precariedade-e-omissao-1.3223590